Por que sentimos cócegas? O que a ciência revela sobre essa reação curiosa 6o192z

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Sensação divertida e universal, as cócegas escondem segredos evolutivos, sociais e neurológicos que intrigaram pensadores desde a Grécia Antiga

  • Por Brazil Health
  • 11/06/2025 13h20
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Gabe Pierce/Unsplash Mãe faz cócegas no filho Cócegas, mãe e filho

Quem nunca se contorceu de tanto rir ao ser surpreendido por um toque inesperado nas axilas ou na sola dos pés? A sensação de cócegas é uma das experiências mais peculiares e universais do ser humano, mas também uma das mais misteriosas. Por que reagimos dessa forma? E por que é praticamente impossível nos fazer cócegas? Por mais de 2.000 anos, filósofos e cientistas de diversas épocas e lugares, como Sócrates, Aristóteles, Bacon, Galileu, Descartes e Darwin já se debruçaram sobre o assunto sem uma conclusão clara. A ciência moderna tem desvendado alguns dos segredos por trás dessa reação curiosa, revelando mecanismos cerebrais complexos e funções que vão muito além da simples diversão.

O que são as cócegas e como o cérebro interpreta o estímulo? 3n3x42

Para começar, é importante saber que existem dois tipos principais de cócegas. A primeira é a knismesis, uma sensação mais suave, como um formigamento ou coceira leve, que não provoca riso. Ela pode ser causada por um toque sutil, como o de uma pena ou até mesmo um inseto caminhando sobre a pele. Já o segundo tipo, a gargalesis, é a cócega “de verdade” — aquela que nos faz gargalhar e nos contorcer quando alguém nos toca nas costelas ou na sola dos pés, geralmente de forma mais forte e repetitiva.

Do ponto de vista neurocientífico, uma complexa sequência de eventos é necessária para que o estímulo se transforme quase como mágica em riso. Tudo começa na pele, onde receptores sensoriais captam o toque e transformam essa informação em sinais elétricos. Esses sinais viajam por vias nervosas até o tálamo, uma “central de distribuição” cerebral, e de lá seguem para o córtex somatossensorial, que interpreta o estímulo tátil.

Mas a experiência das cócegas envolve mais do que tato. Regiões como o sistema límbico e a amígdala — ligadas às emoções — também são ativadas. Isso ajuda a explicar por que as cócegas podem provocar tanto riso quanto desconforto. O cérebro interpreta o toque como uma surpresa e ativa áreas associadas ao prazer, à defesa e à interação social.

Para que servem as cócegas? 383e1k

As cócegas provavelmente desempenharam papéis importantes ao longo da evolução. A knismesis pode ter surgido como um sistema de alarme sensorial para detectar ameaças leves, como insetos, ajudando na autoproteção.

Já a gargalesis parece ter função social. Brincadeiras de cócegas entre pais e filhos, irmãos e amigos criam laços afetivos e estimulam comportamentos de confiança e intimidade. Elas também funcionam como treino corporal: ao reagir a cócegas, crianças desenvolvem reflexos, noção de limites e autodefesa, de forma segura e divertida.

As regiões mais sensíveis às cócegas coincidem com áreas vulneráveis do corpo — como barriga, costelas e pés — e essa hipersensibilidade pode ter evoluído como um mecanismo de proteção extra. O próprio Darwin sugeriu que as cócegas exigem confiança: só permitimos que alguém nos provoque cócegas quando nos sentimos seguros com essa pessoa.

Por que não conseguimos fazer cócegas em nós mesmos? 3r2nu

Uma das características mais intrigantes das cócegas é que elas praticamente não funcionam quando tentamos provocá-las em nós mesmos. O responsável por isso é o cerebelo, estrutura ligada à coordenação motora e à previsão de movimentos. Quando você tenta se tocar, o cerebelo avisa outras áreas do cérebro sobre o que está por vir — e essa previsibilidade neutraliza a reação.

Estudos com robôs controlados por humanos mostraram que, ao eliminar o fator surpresa (mantendo o controle total do movimento), a sensação de cócegas desaparece. Mas se o toque é imprevisível, mesmo que leve, a sensação retorna. O cérebro precisa ser pego de surpresa para reagir.

Curiosidades científicas sobre as cócegas 51l3y

Pesquisas recentes revelam que pessoas com esquizofrenia podem sentir cócegas ao se tocarem, provavelmente por falhas na diferenciação entre estímulos internos e externos. E outros mamíferos também demonstram sensações parecidas: chimpanzés e ratos, por exemplo, reagem a cócegas com comportamentos semelhantes ao riso, reforçando a ideia de que se trata de uma ferramenta de vínculo social entre espécies.

Estudos nessa área também oferecem pistas sobre distúrbios neurológicos, como o autismo, em que o processamento sensorial pode ser alterado. Entender as cócegas ajuda a compreender como o cérebro humano filtra estímulos e responde emocionalmente ao ambiente.

Conclusão: mais do que uma simples brincadeira 4l566y

As cócegas são uma janela fascinante para a complexidade do cérebro humano. Elas revelam muito sobre como sentimos o mundo, como nos conectamos com os outros e como nosso cérebro diferencia o previsível do inesperado. Muito além da diversão, elas envolvem aspectos neurológicos, emocionais, evolutivos e sociais.

Na próxima vez que estiver rindo descontroladamente em meio a uma guerra de cócegas, saiba que está participando de um fenômeno antigo e profundo, que une neurociência e afeto em uma das experiências mais humanas que existem.

Cesar Cimonari de Almeida – CRM 150620-SP / RQE 66640
Neurocirurgião e membro da Brazil Health

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